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Competência para julgar os Recursos Contra Expedição de Diploma
- 21 de março de 2018
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é o órgão competente para julgar os Recursos Contra Expedição de Diploma (RCED) nas eleições presidenciais e gerais (federais e estaduais).
Com essa orientação, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental em face de jurisprudência fixada pelo TSE.
O Tribunal lembrou que o RCED foi originariamente concebido como recurso administrativo, mas a evolução jurisprudencial, acolheu o instituto como ação autônoma, dando origem a processo de cunho jurisdicional. Por sua vez, a Lei 12.891/2013, ao chancelar esse entendimento, alterou as hipóteses de cabimento do RCED, com o intuito de realizar distinção mais precisa em relação à Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), destinada à persecução nos casos de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.
Por meio do RCED, objetiva-se a cassação ou denegação do diploma do eleito ante a alegação de inelegibilidade de cunho infraconstitucional superveniente ao requerimento de registro da candidatura, inelegibilidade de natureza constitucional ou ausência de condições de elegibilidade.
O sistema estabelecido pelo Código Eleitoral consagra a apreciação do RCED, como ação autônoma, pelo órgão jurisdicional hierarquicamente superior àquele que concedeu a diplomação. A exceção refere-se à competência, atribuída originariamente ao TSE, para julgar as impugnações à diplomação do presidente e do vice-presidente da República.
A existência de fase probatória no rito do RCED, entretanto, não impede seu reconhecimento como “recurso”, nos moldes do art. 121, § 4º, da CF (1). A concepção constitucional da palavra “recurso” é ampla, e estabelece a possibilidade de revisão jurisdicional. Além disso, a admissibilidade de produção probatória no rito recursal em sentido estrito é reconhecida no art. 938, § 3º (2), do CPC.
Ademais, a diplomação constitui ato decisório do tribunal, ainda que de natureza administrativa. A expedição do diploma ocorre apenas após a análise dos requisitos para sua concessão ao candidato, bem como ante a verificação da lisura do pleito. Havendo atividade de aplicação do direito ao caso concreto, qualifica-se o ato como decisão.
De igual modo, as partes não podem impugnar o resultado das eleições por livre escolha de foro (opção entre Ações de Investigação Judicial Eleitoral; Ação de Impugnação de Mandato Eletivo; ou RCED). Isso porque o RCED possui hipótese de cabimento bem definida: suscitar inelegibilidade de ordem constitucional ou surgida após o pedido de registro, ou, ainda, ausência de condição de elegibilidade. As outras ações, por sua vez, têm como fundamento abuso de poder econômico ou político, captação ou uso ilícito de recurso para fins eleitorais, captação ilícita de sufrágio, prática de conduta vedada, corrupção ou fraude.
Ainda que assim não fosse, a concorrência de vários órgãos competentes para conhecer da mesma matéria não ofende o princípio do juiz natural. Existe a figura do “forum shopping”, ou seja, a possibilidade de escolha, pelo autor, de um dentre vários foros competentes para conhecer da causa. É o que ocorre, por exemplo, nas hipóteses em que se faculta ao autor escolher entre o foro da situação da coisa, o foro do domicílio do réu ou o foro de eleição.
O Colegiado afastou alegação no sentido de que a supressão da fase jurisdicional perante o TRE configuraria violação aos princípios do duplo grau de jurisdição, do devido processo legal e do contraditório. O devido processo legal e o contraditório são plenamente observados no curso do feito em trâmite no juízo com competência originária, pois há ampla instrução probatória e regular exercício do direito de defesa no rito do RCED. Aliás, o julgamento da causa pelo órgão hierarquicamente superior potencializa o devido processo legal, pois a instrução ocorre diretamente perante o tribunal, aproximando-o da verdade material.
Além disso, mesmo no âmbito criminal, o STF entende que o duplo grau de jurisdição, não obstante sua previsão como princípio na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, não se aplica aos casos de jurisdição superior originária. Mais ainda, segundo a jurisprudência da Corte, não há no ordenamento jurídico brasileiro a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição. Nesse ponto, a leitura do texto constitucional revela uma permissão para que sejam decididas causas em única instância [CF, arts. 102, III (3); e 105, III (4)]. A adoção do duplo grau de jurisdição, portanto, é uma escolha política do legislador para cada sistema processual.
Por fim, o princípio da segurança jurídica também milita em favor desse entendimento. Constitui sólida e antiga jurisprudência do TSE ser da sua competência o julgamento de recurso contra a diplomação de senador, deputado federal e seus suplentes, governador e vice-governador.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que julgou o pedido procedente.
(1) CF: “Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. § 4º – Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando: I – forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei; II – ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais; III – versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais; IV – anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais; V – denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção.”
(2) CPC: “Art. 938. A questão preliminar suscitada no julgamento será decidida antes do mérito, deste não se conhecendo caso seja incompatível com a decisão. § 3o Reconhecida a necessidade de produção de prova, o relator converterá o julgamento em diligência, que se realizará no tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, decidindo-se o recurso após a conclusão da instrução.
(3) CF: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição. d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.”
(4) CF: “Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: II – julgar, em recurso ordinário: a) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória; b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão; c) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País;”
ADPF 167/DF, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 7.3.2018. (ADPF-167)